A Lira Ceciliana de Prados, assim como as congêneres orquestras de Tiradentes e São João del-Rei, é herdeira de uma prática musical originada no movimento artístico que floresceu em Minas Gerais a partir do século XVIII e do qual, certamente, o compositor Manoel Dias de Oliveira (1734/5-1813) é um dos grandes expoentes. Em Prados, o primeiro registro noticiando o pagamento a músicos que tocaram numa festa religiosa é datado de 1726, constando no Livro de Receitas e Despesas da Irmandade de São Miguel e Almas. Desde então, essa prática musical vem sendo cultivada ao longo dos séculos, tendo passado pela transição do profissionalismo da época aurífera para um diletantismo em certa medida idealista, o qual garantiu sua permanência desde meados do século XIX até nossos dias. A Lira Ceciliana, co mo sociedade de músicos, tem sua origem situada tradicionalmente no ano de 1858 e mantém em constante atividade, além do coro e da orquestra que hoje aqui se apresentam, também uma banda de música e uma pequena escola para formação de seus novos integrantes.
          O repertório apresentado pretende ser ilustrativo da diversidade presente nas composições de Manoel Dias de Oliveira, bem como das atuais atividades da Lira Ceciliana, que, por um lado, se vinculam ao passado de suas origens e, por outro, seguem rumo à diversidade e ao ecletismo. O gradual e o ofertório que abrem a primeira parte do programa, com coro e orquestra, formam uma composição destinada à missa da Quinta-feira Santa, editada e publicada recentemente com base em manuscritos anônimos existentes no Museu da Música de Mariana. Ambas revelam, porém, traços composicionais característicos da escrita de Manoel Dias, evidenciando, apenas para citar o exemplo mais marcante, flagrantes semelhanças com o Ofertório Justus ut palma, obra sua já bastante conhecida, registrada em mais de uma gravação. Na sequência, o célebre Miserere, atribuído ao compositor por tradição secular de São João del-Rei e ora apresentado na versão executada anualmente em Prados, durante a Semana Santa, com o baixo contínuo realizado por Adhemar Campos Filho, e o Kyrie que constitui a Missa de (continua)